Ainda estamos no começo do ano, há tempo para fazermos uma revisão de vida, novas expectativas e planos para o futuro, e assim, gostaria de refletir sobre o tempo e os acontecimentos que marcam nossa história.
A gente vive reclamando que nos falta tempo pra tudo. Mas será que realmente isso é verdade ou acabamos “desperdiçando” tempo com coisas desnecessárias e perecíveis? Há duas expressões dos poetas romanos Virgilio e Oracio que nos ajudam a pensar sobre o tempo: “Tempus Fugit” e “Carpe Diem”. A primeira, atribuído a Virgilio, é traduzida como “o tempo foge”, ou seja, não somos capazes de ter controle sobre ele, o tempo se esvai como grãos de areia entre os dedos da mão. Já a segunda, de autoria de Horácio, lembra-nos da necessidade de “aproveitar bem o dia presente”, vivê-lo com intensidade.
O tempo sempre foi um desafio para nós. Se hoje, numa ótica capitalista, dizemos que sua equalização e bom uso é fonte de lucros (tempo é dinheiro), na antiguidade ele era visto com pessimismo e crueldade pois o tempo não perdoa nada, nem ninguém; lembremos que, Krónos, a divindade do tempo, era retratado como um ser que devora os seus filhos. Na perspectiva judaico-cristã tivemos um salto de qualidade. Deus, ao se revelar, estabelecer aliança e prometer libertação ao seu povo, estabelece um novo tempo, um tempo oportuno de graça e salvação, que chamamos Kairós. Outro passo de máxima importância é dado na pessoa de Jesus Cristo em quem, “cumpri-se o tempo”, ou seja, o tempo chega ao ápice de sua realização, aliás, transforma-se desde sua essência de modo que deixa pra trás sua caducidade e se reveste de uma amplitude em vista da eternidade.
Fazendo um paralelo entre Krónos e Kairós, podemos dizer que Krónos tem a ver com tudo o que envelhece e tende a desaparecer por completo; é o tempo cronológico, medido e quantificado, limitado e finito com tudo aquilo que a ele está ligado. Muitas das nossas satisfações e ambições (posição social, prestígio, bens) são finitas e tem prazo de validade. O mesmo não ocorre com o Kairós. Sendo o tempo de Deus e acréscimo de graça a tudo aquilo que a Ele está ligado, tende não só a perdurar e permanecer no tempo mas, ter sua máxima potencialização na eternidade. É no âmbito do Kairós que se encontra nossa relação com Deus; os verdadeiros valores e sentimentos que tocam o mais profundo do nosso ser como amor, respeito, compaixão, pertença, solidariedade, justiça, família e amigos.
Finalizando, poderíamos refletir se realmente estamos investindo bem o nosso tempo, se estamos “gastando” nosso tempo com pessoas, momentos, tarefas e situações que realmente façam sentido e preenchem nossas vidas. Creio que o que realmente conta não é o que o tempo faz conosco, mas o que fazemos com o tempo. Que possamos aproveitar bem esse novo ano que Deus nos concedeu. Realizar boas obras, lançar sementes, produzir bons frutos, enfim, viver o Kairós de Deus que começa nesse mundo e perdura por toda a eternidade.
Pe. Paulo Sérgio Carlos
Presbítero da Diocese de Piracicaba